A imagem de Jesus ajoelhado aos pés da humanidade, está na minha mente há algum tempo. Jesus se abaixando para limpar e curar as feridas e para lavar os pés, sem dizer nenhuma palavra, mas com lágrimas escorrendo pelo rosto. Como é diferente da imagem de um Deus que julga, condena e pune; um Deus que vê os seres humanos como culpados. Por muitos séculos, as pessoas tiveram esta imagem de Deus. Mas Jesus nos diz: "Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei" (Mt 11, 28).
Hoje as pessoas estão exaustas. Há muito que fazer, muitas coisas a aprender. A competição está em toda parte, poucos são os vencedores e muitos os perdedores. A vida é uma luta constante pela sobrevivência. Muitas pessoas têm que usar máscaras para esconder sua falta de coragem, as dores do seu coração, seu desespero, sua falta de senso de dignidade, porque às vezes eles não têm trabalho.
Outras pessoas estão cansadas de tantas horas de viagem para o trabalho e para casa, suas agendas superlotadas, compromissos, metas a alcançar e todos os problemas sociais ainda não resolvidos e os problemas do mundo. Quando as pessoas estão muito cansadas e fragmentadas, elas perdem a energia e o desejo de celebrar, de agradecer. Elas não têm mais tempo para as outras pessoas, especialmente para os pobres e marginalizados, elas não têm tempo para abrir o coração.
Jesus ao lavar os pés dos discípulos nos mostra como Deus ama, e como seus discípulos, naquela época e hoje também, são chamados a amar e a "amar até o fim".
Finalmente, o lava-pés é um mistério como muitos outros atos de Jesus. Nós entramos neste mistério gradativamente, através de momentos em que sofremos perdas e nos tiram mais e mais o que possuímos. Quando Jesus diz a Pedro que ele entenderá 'mais tarde' Jesus está dizendo aos seus discípulos que é somente depois da longa noite do desconhecimento, e somente por um novo dom do Espírito Santo, que podemos penetrar este mistério e vivê-lo.
Jesus convida seus amigos a tirarem as roupas que lhes dão um status especial, a retirar as máscaras e a se apresentar perante os outros humildemente, vulneravelmente, com toda a sua pobreza. Para se tornar pequeno e humilde é necessário um coração cheio de amor, purificado dos seus medos e da segurança humana, pronto para amar até o fim, a fim de dar a vida aos outros.
Como Jesus quer que o imitemos? Jesus nos convida a seguí-lo na caminho da pequenez, do perdão, da confiança, da comunhão a da vulnerabilidade - sem abandonar em outros momentos nosso papel de responsabilidade onde exercemos autoridade com força e justiça, bondade e firmeza. Jesus nos convida a viver a loucura do Evangelho, não julgar os outros, mas sermos compassivos, perdoar e amar até o fim, e até amar aos nossos inimigos. Isto é impossível a menos que retiremos nossas vestes e nos tornemos pobres e desnudos perante Deus, para que estejamos totalmente "revestidos de Cristo."
Algumas pessoas, inspiradas pelo Espírito Santo, vivem mais profundamente a bênção do lava-pés, de sentar e comer com o pobre, o manco, o aleijado e o cego. Outros que têm importantes papeis na sociedade são tocados pelo sermão da montanha e pelo seu exemplo de vida. Eles anseiam por seguí-lo mais de perto. O rei Luís IX da França - S. Luís - costumava lavar os pés os doentes, todo ano na Quinta-feira Santa. Ele gostava de receber mendigos em sua casa e os servia na mesa. Um dia, enquanto ele caminhava com um acompanhante, eles ouviram o sino que avisava a aproximação de um leproso. Seu acompanhante correu, com medo de ter contato com o leproso. Luís no entanto, foi ao encontro do leproso e beijou-lhe a mão. Mahatma Ghandi quando visitava uma cidade, sempre procurava ficar com os "intocáveis" (os que pertencem as mais baixas castas da sociedade indiana), Ghandi passou a chamá-los de harijans, "filhos de Deus". Na sua própria vida na comunidade, no ashram onde ele vivia, mesmo quando tinha um importante papel na política, ele fazia questão de lavar os banheiros - e continuou a fazer isto até o final de sua vida. Desta forma, Ghandi testemunhava Jesus, pobre e humilde, Jesus o servo, que ele tanto admirava.
Depende de cada um de nós descobrir como somos chamados a ser mais "revestido de Cristo," a fim de servirmos nossos irmãos e irmãs com amor, bondade e humildade. Depende de cada um se aproximar mais daqueles que estão "abaixo", ajudá-los a se levantar, ouvi-los, pedir seus conselhos, aceitá-los como são, com todas as suas diferenças, ser um deles.
Jesus insiste para que os discípulos lavem os pés uns dos outros. Ele diz a Pedro que é absolutamente necessário que ele lhe deixe lavar os pés, caso contrário, ele não terá parte com Jesus. Jesus afirma que ao fazer isto, ele está nos dando um exemplo a ser seguido, e que isto é uma bem-aventurança e uma benção. Tudo isto é porque Jesus quer que tenhamos uma atitude interior de humildade e serviço em todas as ocasiões. Mas ele também está afirmando a importância de realmente lavarmos os pés uns dos outros. Este ato de humildade expressa de forma concreta o nosso amor e respeito pelos outros.
A Igreja Católica Romana realiza na Quinta-feira Santa a cerimônia do lava-pés, quando o padre lava os pés de doze membros da comunidade, como um sinal de obediência a Jesus. Não está Jesus pedindo que todos os membros das comunidades cristãs, de todas as famílias cristãs, lavem os pés uns dos outros em uma cerimonia bem preparada, em espírito de oração, serviço e comunhão?
Lavar os pés de um irmão ou irmã em Cristo, permitir que alguém lave os nossos pés, é um sinal de que juntos nós queremos seguir a Jesus, tomar o caminho da pequenez, para encontrar a presença de Jesus no pobre e no fraco. Isto não é um sinal de que queremos viver um relacionamento de coração com os outros, encontrá-los como uma pessoa e um amigo, e viver em comunhão com eles? Não é isto um sinal de que desejamos ser homens e mulheres de perdão, desejamos ser curados e purificados para curarmos e purificarmos os outros e então vivermos em maior comunhão com Jesus?
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